segunda-feira, 25 de outubro de 2010
Lavador de pratos
Lavo pratos na cozinha de um restaurante chinês. Sem nenhuma eficiência. Devagar e distraído. Sempre prestes a ser demitido. Mas por alguma razão, nunca sou. Volto todos os dias. Ninguém fala nada. Ninguém me olha. Então volto de novo. Preciso do emprego. Então continuo. No vai-e-vem das pilhas de pratos, sinto fome. Vontade de pegar restos de comida que sobram nos pratos. Quase tenho coragem. Mas não dá tempo. Garçons e afins se atropelam na porta. Todo mundo reclama da minha lentidão. Sou desorganizado com as louças. Deixo as pilhas ficarem cada vez maiores. Mas finjo não compreender nada. Continuo. Enquanto a água limpa escorre quente, resseca a pele. Os dedos enrugam. Estou no calor das panelas fervendo. Tudo demora. O suor pinga da testa. Arde o olho. Queria ouvir uma música talvez. Mas só há o barulho da pressa dos talheres que batem nos copos. Sinfonia articulada dos segundos, que passam inteiros. De um em um. Segundo um ritmo pesado e lento. A hora de embora não chega. Até de madrugada, quando misteriosamente tudo acaba. Cozinha pronta para o dia seguinte. Então vou. No caminho até a estação do metrô, o vento escuro de janeiro em Canal Street dá saudade de uma casa qualquer.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Arquivo do blog
-
▼
2010
(95)
-
▼
outubro
(36)
- os dias
- Voo
- Pedra rosada
- 917 lembranças
- Nenhum lugar
- saudade
- diurno noturno
- sonho
- impossível
- Lavador de pratos
- Nova Iorque, 1988
- lágrima
- Desistência
- Despedida
- prisioneiro
- esquecimento
- Noventa graus
- Madrugada
- Uma passagem
- Amores perdidos
- Amores proibidos
- Amores finitos
- Jardineiro
- Exposto
- O outro
- ...
- 1974
- Reminiscências
- Tempo
- Amores líquidos
- Amores primeiros
- Passagens
- Amores distantes
- Deserto
- Silêncio
- Ação
-
▼
outubro
(36)
Nenhum comentário:
Postar um comentário